quarta-feira, 28 de outubro de 2009

------AS TROPELIAS DO CAIM SARAMAGO-----

Perante a intempestiva declaração pública do lançamento do livro "Caim", saltaram para os média, de imediato, intempestivas reacções à ousadia literária daquele que, vivendo dos escritos que imagina, se exprimiu em sentimento não profundamente esclarecido sobre as intenções dos milenares escritos, mais no sentido de obter um êxito nas vendas, facto que interessa sempre quer a editores e livreiros quer aos escritores, parecendo ter sido esse o objectivo primeiro, e não o de denegrir o que quer que seja que se encontre escrito no Livro que resultou da primeira compilação de textos anónimos e o primeiro "impresso", com inegável influência na civilização ocidental. É certo que um escritor consonante com qualquer das congregações que têm por base a interpretação que fazem da Bíblia, não se atreveria a questionar o seu conteúdo, quer interprete ou não alguma coisa que lhe faça sentido a partir dos respectivos textos. O que parece, no entanto, é que quem mais se pronuncia sobre aquilo que considera um ataque ao "Livro Sagrado" são os "curas". Quer leigos quer frequentadores das oficinas da religião, ninguém parece saber ler os textos lá incluídos, sejam do primeiro ou do segundo testamento. Uns, mais contidos, limitam-se a discordar e até a achar que há homens que com a velhice perdem o medo e se atrevem a criticar o instrumento literário, suposta causa principal de um império que dura há dezasseis séculos. Hoje a audácia anda à solta, uma vez que as fogueiras ateadas pelos juízes dos autos de fé, há muito que se apagaram. Outros, mais ávidos de chamarem a atenção dos que, ocupando os púlpitos de todas as freguesias do país, querem atrair a atenção dos seus "donos religiosos", e entornam-se completamente, derramando palavras com a intenção de enxotar os "cães vadios" que, com os seus palavreados de solta inspiração, são factor de desvio do rebanho, aumentando constantemente o número de ovelhas tresmalhadas. Em primeiro lugar, a bíblia, quer os escritos de antes da nossa era, A.T., quer os escritos (gregos) dos séculos II e III, N.T., deve ser lida e interpretada por quem "sabe", à luz dos motivos por que foram escritos e no contexto remoto de uma época que nos escapa, tendo sido transcritos, copiados, copiados, ..., as vezes que não sabemos. Em segundo lugar, nenhum texto contido na Bíblia deve ser entendido à "letra", e a interpretação das alegorias e outras figuras literárias não está de modo simples ao alcance de todos. Pelo que me é dado observar, quem menos parece (?) saber interpretar esses textos são os "obreiros da igreja" que em todas as missas falam neles, dando-lhes o sentido que lhes convém, repetindo apenas alguns até à exaustão, sempre com interpretações que mais parecem avisos, a quem não se submeta ao rebanho. Talvez por isso, mais pareçam uma charada simplória em cada tempo e lugar. Uma Verdade ditada pela Natureza nunca teria necessidade de instrumentos humanos guardiões do "trabalho de Deus". Quer os que criticam ferozmente ... quer os que tiram benefício da hipotética revelação, colocam-se fora deste mundo. Parafraseando Miguel de Unamuno, no decorrer da história lá aparecem, de vez em quando, os "hereges" a matarem as insuspeitas teses religiosas como instrumentos de domínio. Reagindo, logo aparecem os donos daquelas teses, insuspeitos donos da Verdade, a matarem as audazes heresias. E assim, neste liberto mundo do século XXI, lá continuam, matando-se. Uns e outros, sem atribuir a inevitável razão a quem quer que seja, não esqueçam: o Tempo é uma prerrogativa da Natureza e nesta está contida a Verdade! Aquele revela-la-á sempre, demore o tempo que demorar. Não será nos nossos dias, mas chegará a era em que aqueles que sempre tentaram defender a sua condição hegemónica numa das partes do mundo, recorrendo à guerra quando foi necessário, condenando aqueles que apelida de hereges por discordarem da religião imposta, terão chegado à conclusão que não valeu a pena terem sacrificado tantos "inocentes". Quando por esse meio não conseguiram dominar os pensamentos, criaram a figura do teólogo, passado a curso superior interno, como resposta ao atrevimento dos filósofos no seu irreverente levantar de utopias pela pesquisa da Verdade, mesmo em épocas da justiça eclesial das fogueiras. A tentativa de ocultar a verdade pelo fogo não surtiu efeito. Por muitos passos de gigante que a ciência tenha dado, as cavernas ocultas da Natureza ainda têm muito que revelar e, o que caminha fora Dela cego anda desde Gomorra. Mas o mais interessante deste episódio é que, no percurso daquela odisseia que Saramago "atribui" a Caim, tenha surgido logo na segunda etapa das peripécias, um macho latino em terras hebraicas, mais do que cumprindo a ordem tribal "crescei e multiplicai-vos", são autênticas imagens de um filme de "sexo e crime". Vá se lá saber que mais tropelias existem na imaginação da irreverente Terceira Idade, onde o estatuto não permite, mesmo aos Senhores do Mundo, reis das catacumbas, classificar de heresia ou pecado. Há fenómenos assim. Era necessária uma antecipação à Fúria Divina que aí vinha. Ai vende, vende! .

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